17/07/2019

17/07/2019

Quando os nossos dados têm muito pouco de anónimos


Os nossos smartphones podem ser extremamente convenientes, mas o seu potencial para abusos de privacidade é extremamente preocupante - e temos mais um relato que nos mostra o tipo de coisas que tem estado a ser feito nas costas dos utilizadores, relativamente à informação da sua localização.


Desde sempre que a tecnologia dos telefones e telemóveis tem a componente que permite saber a localização dos seus utilizadores. No caso dos telemóveis, é algo que os operadores há muito usam para inferir padrões de tráfego e outras coisas, mas que não preocupam demasiado os utilizadores, uma vez que a precisão desse método é razoavelmente vago, podendo posicionar apenas o utilizador numa área com vários quilómetros quadrados. Mas com a chegada dos smartphones, equipados com GPS e repletos de apps dispostas a tudo em troca de lhe darmos acesso à localização, o caso muda de figura.

Existem empresas que se dedicam a obter e comercializar informação sobre a localização das pessoas, com precisão assustadora - não só permitindo saber onde moram, mas até em que sala de um edifício trabalham. Nalguns casos essas bases de dados contam contam com milhares de registos diários para cada utilizador, e que mesmo sendo vendidos de forma anónima, sem referência a que pessoa pertencem, de pouco consolo serve aos visados. Isto porque, como já foi demonstrado no passado, saber todo o percurso de uma pessoa ao longo de dias, ou meses, permite identificá-la sem grandes dificuldades: quantas pessoas moram no local A, trabalham no local B, e fazem o percurso C?


A questão, é que estes dados permitem fazer muito mais. Que tal saber que uma pessoa visitou um determinada clínica especializada em planeamento familiar e por lá permaneceu par de horas? Ou saber que em determinada noite, em vez de ir para casa como seria habitual, a pessoa foi para um motel onde a sua localização coincidiu com a de um(a) colega, ou patrão, ou etc.? Ou então, que tal analisar os padrões de deslocações de pessoas que trabalhem em locais específicos, como centrais nucleares, e saber exactamente quando estão em casa, fora de casa, quando tomam café e onde, quando deixam os filhos na escola, etc?


Se noutros tempos se dizia que não havia motivos para recear que se estivesse a ser espiado por isso não ser praticável para milhões de pessoas, este tipo de dados faz com que esse tarefa se resuma a alguns comandos de pesquisa. Que tal procurarmos por pessoas que estiveram em determinada manifestação e que também tenham por hábito reunir-se regularmente em determinado local onde também estão presentes outros manifestantes ou activistas? Ou então, que tal pessoas que costumam andar de carro no início do mês, mas que passam a andar de transportes públicos no final do mês? Ou até aqueles que mensalmente passam pela segurança social, mas que no resto do mês passam a vida na esplanada de um café? Ou...qualquer uma outra coisa que vos passe pela cabeça!


O grande problema é que este tipo de recolha de dados é feita por todos os lados. Já vimos que a Google muito gosta de saber pode onde andamos, e que nem sequer a desculpa de que este tipo de dados só está acessível a pessoas que se sabem comportar nos serve de muito. Este tipo de dados pode ser recolhido por apps que aparentam ser tão inocentes quando uma app de meteorologia - como acontecia com a app do The Weather Channel, de uma subsidiária da  IBM, que usava estes dados para extrair informações que eram vendidas a empresas de gestão de fundos.


Mesmo sabendo-se que pouco se poderá fazer quanto a isso, no mínimo poderemos exigir que estas empresas sejam obrigadas a ser mais claras e transparente quando ao uso que fazem dos nossos dados. Está mais que visto que não se deverá permitir que seja utilizada a desculpa de que se tratam de dados "anonimizados" para que fiquem livres de todas as directivas do RGPD - já que, mesmo sem um nome associado, a informação sobre a nossa localização continua a ser informação pessoal que deveria estar abrangida pelas mesmas protecções que tudo o resto.




0 comments:

Enviar um comentário